A orelha será mesmo a única coisa torcida, nesta história que se relata quase de um fôlego. Mas de muitos mais necessitaria — talvez de sete — para acalmar a excitação que este felino suscita, ele que é apelidado de Peter Pan dos gatos, tal é a sua queda para a brincadeira.
O nascimento de uma raça
No que ao American Curl diz respeito, o difícil é estruturar com sucesso um texto, no qual se tente abarcar a descrição da sua beleza física, do seu charme elegante, do seu temperamento espirituoso e infantil, e ainda o seu inesperado e surpreendente surgimento. Por onde começar? Recuemos até ao ano de 1981 e demos início a este relato contando a história incontornável de como tudo aconteceu. Joe e Grace Ruga, um casal de norteamericanos, então a viverem em Lakewood, na Califórnia, foram surpreendidos, em pleno Verão, com a visita de dois gatinhos, que aparentavam ter sido abandonados, e que exibiam umas orelhas esquisitas. Algumas refeições e outro tanto mimo depois e os então já baptizados de Panda e Shulamith faziam parte da família. Panda desapareceria, mas Shulamith, uma gata de longo pêlo preto, não mais abandonaria a sua família adoptiva. Pela altura do Natal, quase em troca de tão afável acolhimento, a gata brinda os donos com uma ninhada de gatinhos, todos eles com as mesmas orelhas reviradas da mãe.
O desejável é uma curvatura das orelhas entre os 90 e os 180 graus
Num ápice, gera-se um debate mundial sobre aquela espontânea mutação genética, mero capricho da natureza, que revirava para trás, num ângulo de 90 graus, as pequenas e curiosas orelhas deste grupo de gatos, sem qualquer tipo de interferência na sua saúde ou personalidade. Em apenas dois anos e, através de cruzamentos selectivos, já se pensava no passo seguinte: desenvolver uma nova raça. Foi o que aconteceu. Chamaram- lhe American Curl, qualquer coisa como americano encaracolado e em 1983 foi pela primeira vez exibido num concurso. Quando em 1989, Roy Robinson, especialista em genética felina, publica um artigo, no Journal of Heredity, concluindo não haver qualquer defeito nos quase 400 gatos com esta particularidade analisados, o American Curl já era um campeão.
Um retrato
Apenas entre o terceiro e o quinto dia de vida é que as orelhas de um gatinho recém-nascido começam a enrolar-se para trás, levando os seguintes quatro meses a moldar a sua forma definitiva, podendo ficar perto dos 180 graus ou quase hirtas, muito semelhantes às de outras raças. Porém, quando o propósito é que participem em concursos, então, o desejável é uma curvatura entre os 90 e os 180 graus, que lhes confere aquele ar peculiar, alegremente surpreendido e, ao mesmo tempo, muito coquete, pois parece que usam um qualquer chapéu de linhas estilizadas. Ainda que este seja indubitavelmente o mais óbvio dos seus traços físicos, muitos outros distinguem um American Curl: olhos expressivos e arredondados em forma de avelã, o formato rectangular do seu corpo de porte médio, e o pêlo liso e sedoso, seja na variante de pêlo curto ou comprido. Neste último caso, há que somar ao quadro geral, uma cauda farfalhuda e cilíndrica, em tudo semelhante a uma exuberante estola de penas. O que até bate certo com o seu temperamento, pois para esta raça, todos os dias são de festa e celebração.
Dócil, fiel, alegre, bem disposto, afectuoso, animado, curioso e participativo
Vai uma ajudinha?
Com um American Curl em casa não precisará de despertadores. Ele é tão dócil e tão apaixonado por pessoas, outros animais, brincadeiras e todo o tipo de actividades, que o dia lhe parece curto para tudo aquilo em que se pode ocupar, pelo que, não raras vezes, acorda o dono bem cedo, só para desfrutar da sua companhia por mais tempo. Prepare-se para ser mimado, acariciado e beijado por este gato verdadeiramente único e perceba que nunca mais estará sozinho na vida, pois ele estará sempre lá, ao seu lado, em cima de si, colado a si... Dócil, fiel, afectuoso, bem disposto, animado, alegre, curioso e participativo. Isso mesmo. Não há tarefa que rejeite, nem que seja a de ir para o banho com o dono, ou apenas a de se sentar consigo frente à televisão. O seu lema parece ser o mesmo de Os Três Mosqueteiros: Um por todos e todos por um, com maior apetência para o todos por um. No meio de tanto entusiasmo, é de referir que não é palrador, mantendo sempre a voz de gatinho, à qual não dá grande uso, pois, sendo inteligente, utiliza outras formas de comunicar. Na hora de dormir, elege para si próprio um local alto, que pode mesmo ser o topo de uma estante. Mas, calma, ainda não são horas de dormir.